Todos os dias é a mesma cena nas manhãs de segunda à sexta,
da minha vida sem graça. Cá estou, no surrado e incomodo sofá tomando minha
solitária dose de café brasileiro. Me pego olhando pra mesa vazia, onde uma
garrafa de café descansa sobre uma toalha estampada com gravuras de cestos
cheios. Às seis da manhã, minha esposa nunca está em casa, pois nosso filho
caçula têm aulas matinais.
A dois metros do sofá está a estante, nela o aparelho de TV
acabo, marcava seis horas e quarenta minutos daquela manhã, depois que o sinal
foi cortado, esse era o único motivo pra ele ainda está na tomada. Nessa
estante havia alguns livros, uma TV e um console que nos dava mais raiva que
alegria. Ao lado da sala há um quarto de três metros quadrados, ocupado por
dois beliches e um guarda-roupa de seis portas, ali dormem despreocupadamente
Vitória e André, eles só acordam as onze da manhã. Na cabeça deles, quem estuda
na turma da tarde, pode dormir até tarde.
Vitória já fez quinze, mas parece uma moleca de oito. André
tem treze, porém acredita que sabe mais coisas do que eu, seu pai, às vezes eu
gosto mais quando ainda estão dormindo.
São sete horas da manhã, ainda estou na sala, gosto dos
telejornais pela manhã. No quintal, duas árvores com pássaros agitados cantando
em código a mensagem daquele dia. Parecia que cantavam que “a vida pode ser
melhor”, não sei bem se era esse o refrão, eu estava ocupado de mais com minhas
aflições internas.
Às sete e vinte ouço pisadas feminina no corredor externo da
casa, é Karine, que acaba de entrar. Suas pisadas é a deixa para eu me
levantar. Então me levanto pra mais oito horas de trabalho. Saindo da sala
passo pela cozinha. Em cima da cômoda de seis gavetas minha mochila de trabalho
está ao lado da TV vinte polegadas em meu conflituoso quarto. Entre a cama e o guarda-roupa meu uniforme está
cuidadosamente dobrado em uma das cadeiras da mesa que está na
sala.
Enquanto vou me ajeitando, minha mulher vai tagarelando sobre
coisas que aconteceram no portão da escola, ela pensa que estou interessado,
porém não quero magoá-la, deixo ela se expressar. Não posso culpá-la pela minha
incompetência, preguiça e desonestidade.
Se eu fosse um tanto cognitivo entenderia a mensagem dos
pássaros que todos os dias ali estão no mesmo refrão. Se eu fosse menos preguiçoso assumiria meu
papel na família e colocaria ordem nos horários. Se eu não fosse desonesto,
minha mesa teria mais alegria. Se não fosse os desvios dos bares, gandaias e
jogatinas meu sofá seria mais confortável!
Se eu não fosse tão relapso, minha vida teria mais graça.
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